Muita gente já ouviu falar na Wicca. Outras pessoas se assustaram com o termo “Bruxaria”. Alguns já leram sobre os druidas e outros até se trataram com xamãs. Quem nunca fez simpatia de ano novo? Celebrou a Páscoa Cristã presenteando com ovos decorados? Rezou pela Natureza? Quem nunca pediu ao Sol que não se escondesse naquela festa a céu aberto, ou rogou a Lua por um grande amor?
Este é um post sobre o Paganismo. Principalmente para mostrar que não há nada de assustador ou extraordinário nessa palavra. Para desfazer mitos que foram impostos, para falar um pouco da História que ignoramos, para explicar as crenças que herdamos e utilizamos no dia-a-dia.
Primeiramente, desmistificando o Paganismo partindo das questões lingüísticas, Joyce e River Higginbotham (2003, p.24) explicam:
A palavra pagão vem do termo latino paganus, que significa “habitante do campo”. Ele pode ter sido um termo pejorativo criado por habitantes da cidade para descrever “aqueles caipiras ali” (...). Como o termo “pagão” tendeu a possuir um sentido negativo, ele foi adotado mais tarde como um insulto. Durante as Cruzadas, os Cristãos denominaram os Muçulmanos de “pagãos” e, mais tarde, os Protestantes e Católicos atacavam-se uns aos outros com esse termo. Por fim, “ser pagão” passou a significar alguém sem religião.
É bastante comum as pessoas também associarem o termo “pagão” àqueles que não foram batizados no Cristianismo. Contudo, atualmente é possível dizer que pagãos (ou neopagãos) são pessoas que trilham um caminho espiritual centrado na Natureza, se apoiando em determinadas tradições e que trabalham para resgatar formas de religiosidade antigas ou já extintas (pré-cristãs) e adaptá-las à forma de pensar e viver moderna.
Entretanto, pouco se pode falar do Paganismo generalizando-o, pois ele, segundo o casal Higginbotham (2003) “é um termo ‘guarda-chuva’, que descreve uma multiplicidade de tradições religiosas e espirituais”. Dentre elas estão as citadas no início do texto, como a Wicca (ou Bruxaria Moderna), o Druidismo (forma de espiritualidade originária dos povos Celtas) e o Xamanismo (espiritualidade indígena). Ainda assim, podemos citar dois tópicos comuns às tradições pagãs:
• A crença na interconexão com o Universo;
• O respeito à natureza divina e à própria natureza (inclui, portanto, o conceito de igualdade entre os seres, independente de sexo, raça, cor ou credo. Algumas tradições são focadas, inclusive, na face feminina da Divindade. Logo, dificilmente existirão pagãos machistas ou que preguem a submissão feminina).
É preciso leitura e análise prática dos conceitos do Paganismo na atualidade. Abrir a mente para novos conceitos se faz fundamental. Por muito tempo, fomos bombardeados por informações deturpadas por instituições religiosas que transformaram o conceito de paganismo e de suas práticas em ações demoníacas ou malignas. Não é novidade que a Inquisição foi um tempo de perseguições às formas alternativas de religare, marcado pela intolerância e pela dominação.
Apesar disto, muito da cultura pagã resistiu no nosso cotidiano. São datas, práticas e rituais que herdamos dos nossos antepassados e repetimos atualmente, mesmo desconhecendo suas origens. A Igreja, por exemplo, criou a Páscoa Cristã como símbolo do renascimento de Deus. Antes disso, porém, existia Ostara (que é celebrado no Hemisfério Norte no mesmo período da Páscoa), ou o Equinócio de Primavera, que trazia a idéia do renascimento do Deus Sol para fertilizar a Terra. Por falar em fertilidade, daí surgiu o famoso símbolo do Coelho da Páscoa. Os ovos, por sua vez, representavam o nascimento. Ainda hoje, portanto, repetimos os antigos costumes pagãos, nos presenteamos com ovos decorados.
Mas, vale salientar que o Paganismo e suas vertentes, apesar de estarem enraizados na nossa cultura, possuem sensíveis distinções em relação às religiões mais populares. Primeiramente, o Paganismo não oferece um discurso de “salvação”. Tampouco existem “instituições pagãs”. Dificilmente se encontrarão templos wiccanianos, por exemplo, que não sejam os naturais (bosques, praças, parques, praias). Pagãos também não fazem proselitismo – não desejam converter outros indivíduos à sua doutrina e sistema. Pode-se considerar que a maioria dos pagãos até mesmo não é de “mostrar a cara”.
Porém, atualmente, o Paganismo está saindo do armário. Ressurgindo, pouco a pouco, no nosso cenário regional através de adeptos que desejam vivenciar sua espiritualidade livremente, longe da atitude preconceituosa arcaica. São bruxos e bruxas (ou magos, druidas, xamãs, ecléticos, wiccanos, solitários etc) lutando pela quebra dos estereótipos e paradigmas impostos num Ocidente Cristão pelo materialismo e pela dominação, tentando fazer valer os seus direitos de cidadãos com liberdade de escolha, pois assim diz Declaração Universal dos Direitos Humanos, em seu Artigo 18:
“Toda pessoa tem direito à liberdade de pensamento, consciência, religião; esse
direito inclui a liberdade de mudar de religião ou crença, pelo ensino, pela
prática, pelo culto e pela observância, isolada ou coletivamente, em público ou
em particular.”
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HIGGINBOTHAM, Joyce & River. Paganismo: uma introdução da religião centrada na terra. Tradução Ana Carolina Trevisan Camilo. São Paulo: Madras, 2003.
Páscoa. Cultura Brasileira. Disponível em http://www.culturabrasil.org/pascoa.htm
Artigo 18 da Declaração Universal dos Direitos Humanos. Liberdade Religiosa. Disponível em http://www.liberdadereligiosa.org