quarta-feira, 4 de abril de 2007

A Bruxaria saindo das sombras³

Cada um escreve de acordo com suas convicções, inspirados por razões diversas e próprias, no ambiente sócio-cultural e conforme o momento histórico onde está inserido. Portanto, este é um texto quase pessoal.

Hoje, as bruxas estão soltas. E graças aos Deuses! Entretanto, estamos inseridos numa sociedade preconceituosa e, sobretudo, ignorante. Meu propósito não é, entretanto, discorrer sobre as causas, mas sobre as conseqüências dessa desinformação, especialmente no âmbito religioso. Há quem acredite que, quando não se é católico, se é evangélico; quando não evangélico, espírita? Não? Então é ateu?

Muitas dificuldades se apresentam diante daquelas pessoas que não tem uma resposta objetiva à pergunta “Você acredita em Deus?”. Levantemos este questionamento: seria possível reagir com naturalidade a quem acredita não apenas em um, mas em vários deuses? Ou àqueles que não crêem em “Deus”, mas em “Deusa”? Ou ainda àqueles tantos outros que acreditam numa “energia”, ou num “princípio fundamental” ou ainda num “Uno sem sexo”?

É difícil acreditar que, em meio a um mundo de tantas diversidades culturais, apenas as religiões majoritárias (e, em maioria, patrifocais) sejam reconhecidas e respeitadas, enquanto as demais formas de religare, tidas como minoritárias, restam esquecidas ou, pior, descriminadas.

Assim acontece com a Bruxaria hoje. Embora muitos movimentos alternativos e holísticos já tenham compreendido a verdadeira essência dessa religiosidade, a população “massiva” ainda nutre uma aversão medieval às suas manifestações. Precisamos, portanto, plantar uma semente, ainda que individual, para divulgar a verdade e explicar os mitos que envolvem as bruxas¹ e suas práticas.

Conforme disse uma usuária do Orkut em uma das várias comunidades disponíveis sobre o assunto, “a Bruxaria é um conjunto de crenças pagãs e existe desde o começo da humanidade. É uma mistura da Magia Clássica com práticas da Magia Natural.” Já abordamos, neste espaço virtual, a definição de Paganismo e suas ramificações. Segundo a fonte supracitada, “Magia significa trabalhar com energias da Natureza, do Universo e do Homem. A magia tem muitos ramos de estudo, e a Bruxaria é apenas um deles. Seria ela uma espécie de magia da natureza. Você pode ser mago e não ser bruxo, e você pode usar a magia sem estar ligado a natureza.” Entretanto, para iniciar a compreensão da Bruxaria, precisamos entender a Magia.

A Magia parte do princípio do poder da divindade interior, capaz de co-criar em parceria com o Universo, preferencialmente de forma ética e contribuindo para a evolução coletiva. A Magia, simbolicamente, seria como uma energia que permeia tudo e a todos. Essa energia pode ser manipulada² por uma consciência ou várias consciências em conjunto, de modo a se obter o resultado desejado. Uma oração é uma forma de fazer magia, quando projetamos nossos pedidos em palavras e aguardamos que a Consciência Cósmica (ou “Deus”) nos responda em forma de vibrações que provoquem os instantes mais adequados para que, possamos, em nosso livre arbítrio, agir de acordo com nossas decisões. A Magia está presente em várias religiões, senão em todas, apenas não é nomeada dessa forma. Acender uma vela por um pedido a um santo é como preparar um feitiço, só que com menos ingredientes. Embora muitas tradições da Bruxaria sejam iniciáticas, pois na maioria delas se incentiva o sacerdócio e não apenas a devoção, não há “mistérios” a serem aprendidos, uma vez que todos os seres, não apenas os bruxos humanos, têm dentro de si a manifestação da chispa divina e são capazes de utilizá-la conforme a sua intenção.

As religiões têm função doutrinária e ética, que objetiva nos guiar na direção de virtudes superiores e no caminho do Bem. Uma vez submetidos à Lei da Causa e Efeito, somos responsáveis pelas sementes que plantamos no jardim da existência. Em resumo, nossa religião serve como “rédeas” para a nossa maneira de lidar com a Magia – esta que não é boa nem má, nem yin nem yang, mas “o tudo e o nada”.

Fazendo uma alusão ao processo da comunicação, podemos dizer que nossa essência divina é o emissor; a magia o canal; as orações, feitiços, promessas e práticas religiosas a linguagem; e finalmente Deus (seja como cada um o conceba) o receptor que, certamente, irá gerar o que em Publicidade se chama feedback, ou comunicação em retorno – nossas preces atendidas, nossos feitiços que funcionam.

Portanto, podemos perceber que o quadro real da Bruxaria não corresponde ao que dela é pintado. A idéia de pagãos e bruxos como adoradores do demônio foi algo historicamente imposto pela Igreja Católica, com o objetivo de converter a maior parte do povo às suas idéias – motivo muito mais político do que propriamente religioso. A Bruxaria nada mais é do que um conjunto de práticas de ancestralidade profunda; uma maneira, entre tantas outras, de lidar com a magia da melhor forma possível.

Precisamos abrir a mente às verdades que ainda não nos foram ditas e que, por essa razão, nutrem em nós o sentimento preconceituoso de condenar aquilo que desconhecemos. Embora sujeitos a razões diversas e próprias, ao ambiente sócio-cultural e o momento histórico onde estamos inseridos, somos todos iguais: pagãos, cristãos, umbandistas, muçulmanos, Hare-Krishnas, budistas, taoístas... diante da Suprema Consciência Criadora.

Paz e Luz.
________________

¹ A palavra “bruxas” é utilizada no feminino apenas para melhor compreensão popular, uma vez que a maioria das tradições da Bruxaria são abertas para ambos os sexos, sem distinção.

² A palavra “manipulação” é aqui utilizada no sentido do dicionário Michaelis: 1. Preparar (alguma coisa) com a mão. 2. Preparar (medicamento) com corpos simples. 3. Engendrar, forjar. 4. Organizar; ou seja, preparar a energia mágica, transformá-la, projetar nela nossos desejos. Uma vela, numa promessa, é uma forma de manipular a magia através do simbolismo.

³ Título inspirado no livro Wicca - A Bruxaria saindo das Sombras de autoria de Millennium, Editora Madras, e que, a propósito, nunca tive a oportunidade de ler.